terça-feira, 12 de outubro de 2010

Apenas mais um caso de amor.

Marcos chegara em casa um pouco mais tarde do que de costume.
Foi o ultimo dia no curso pré-vestibular que fazia. Estava contente e ansioso para ver se seu esforço iria render bons frutos.


Tomou um banho longo e quente. Isso começou a ser parte do ritual diário que adotou depois que começou a fazer o curso. Recapitulava as matérias que vira durante o dia: física, biologia, português... e inevitavelmente pensava em Isabel.
As poucas vezes que seus olhos se cruzaram hoje foram suficientes para lhe tirar a respiração. Se achava tão bobo.

Depois de quarenta minutos, Marcos saiu do banho. Sua mãe estava reclamando da porta. Ela deixara um prato com comida na escrivaninha do quarto que esfriava rapidamente.
Marcos sentou e começou a ler mesmo enquanto comia, um hábito antigo. Estranhamente encontrou uma página dobrada que, solta, caiu do livro.
Numa letra bem redonda e caprichada estava escrito seu nome: Marcos.


Dona Estela, sentada no sofá da sala levou um tremendo susto quando seu filho, Marcos, descera as escadas e correra para a rua como se a casa estivesse desabando.
Ela olhou pela janela para rua, mas Marcos já havia sumido.
Para onde será, a esta hora da noite, que ele foi com essa pressa toda?
Dona Estela olhou para o relógio. Eram onze e meia... muito tarde. Preocupada ela subiu ao quarto de Marcos. Tudo normal.
Ao lado do prato de comida em cima da escrivaninha, Dona Estela encontrou uma folha, rosa e perfumada.
E leu:


“Queria muito falar com você hoje, mas como sempre, não tive coragem.
Covardia. Foi o meu maior pecado nestes últimos três meses, não sei se ele é um dos capitais. Tomara que não, ou eu tô frita.
Te escrever assim, no ultimo dia de aula, pouco antes da despedida, é como bater e correr, que covardia eu sei.
Mas não me culpe, acho que não suportaria terminar um período tão bom com uma decepção.
Eu queria lembrar de você alegre, como sempre foi. Não quero ter na lembrança seu sorriso amarelo, seus olhos sem saber exatamente para onde olhar ou a sua boca sem saber o que dizer para escapar da saia justa em que te coloquei. Que mico!
Meu amor, ouso chamá-lo assim, não foi à primeira vista, mas estava destinado a acontecer.
E começou como um bem estar, uma sensação gostosa e quente _ Meu Deus, como eu ficava vermelha!_ como quando numa noite muito fria encontramos uma fogueira para nos aquecer.
Gostava de estar perto de você. Pela sua amizade, pela sua alegria, pelo seu sorriso constante e fácil. Procurava apenas estar ali, ao alcance de um sorriso furtivo ou de uma pergunta qualquer sobre matemática ou biologia. Mas infelizmente não eram muitas as suas dúvidas.
Só lamento por ser tão boa em disfarçar o que sinto. Se não fosse, talvez as coisas tivessem sido diferentes. Já me chamaram de falsa, por essa facilidade que tenho, mas não se preocupe, apenas escondo, nunca finjo.
Houve vezes, quando alguma coisa ruim acontecia, que eu fechava os olhos e pensava em você, em como seria bom te ver na segunda feira e pedia pressa ao tempo.
Outras vezes, e não foram poucas, senti raiva. Você me enganava, me dava sinais errados, era carinhoso demais para alguém no meu estado.
Assim, quando eu acreditava que iria acontecer, meu castelinho de areia desmoronava na brisa doce de um sorriso divertido seu: “Te peguei sua boba.” E eu sorria junto para disfarçar.
Bobo! Como podia não notar o que sinto? Você é um bobo.
O tempo foi passando e eu aprendi a conviver com esse amor. Como um cãozinho na corrente, eu passei a alimentá-lo apenas de vez em quando, esperando que, serenamente, ele adoecesse e viesse a morrer sem incomodar a ninguém. Ele fingia que aceitava, mas era só truque, fugia e me fazia passar o maior vexame.
Por diversas vezes como foi difícil não te dizer tudo isso. Descobri que os apaixonados têm uma quase irresistível vontade de falar o que sentem. É algo físico, bem dolorido mesmo. Mas como vê, fui forte. Até agora.
Se quiser me ver estarei, como quem não quer nada, na cafeteria que fica no final da rua do cursinho.
Como disse, não seja maldoso, não venha se estiver com pena de mim, ou se estiver curioso apenas, ou se achar, como não é nada difícil, que é tudo mais uma brincadeirinha de minha parte. Saiba que não preciso ser consolada, também não venha se for por isso. Tô me achando forte e muito bem resolvida com essa minha produção independente.
Também não venha ser achar que não terá coragem.
Afinal, dentre todas as numerosas possibilidades, você querer... bom, você sentir algo parecido por mim é apenas mais uma. Só uma. Isso é uma coisa que aceitei. Então não se force, se você não vier, quando nos encontrarmos de novo, serei a amiga de sempre, como sempre, para sempre.
Então a verdade é que sei você não virá. Não estarei lhe esperando. É o que vou estar me dizendo, é isso que vou estar pensando enquanto aquela maldita porta que abre a cada cinco segundos me tira a concentração e a respiração.
Estarei lá... sentada. Com aquela cara de quem tem um mundinho próprio trancado à chave que só quem está lendo consegue fazer. Não estarei triste. Só estarei lá, na cafeteria da esquina, no final da rua do cursinho, esticando ao máximo esse ultimo dia de aula.
E se você quiser, nos termos que escrevi acima, pode vir. Será muito bem vindo e também haverá um café quente esperando você.


Isabel.”


_Nada de mais, pensou Dona Estela enquanto sentava na cama tentando acalmar o coração disparado. Aquele menino vai ver só uma coisa quando voltar.
Onde já se viu me pregar um susto desses ?!?
Marcos venceu o quilômetro e pouco que separava sua casa da cafeteria em pouco mais de cinco minutos.
Quando chegou quase na porta, parou e pensou:
_Eu não posso entrar lá desse jeito. Cansado, suado... como se estivesse desesperado. Não posso. Se encostou na parede e procurou descansar. Ainda faltava um pouco para a meia noite então ele tinha tempo até que a cafeteria fechasse
Marcos olhou para dentro do Café disfarçadamente e viu que Isabel estava sentada perto do vidro lendo alguma coisa. Respirou fundo mais uma vez e entrou.
Havia um sininho que tocava toda vez que a porta abria. Então Isabel, levantou os olhos e viu Marcos. Ficou imediatamente vermelha, mas não desviou o olhar. Guardou o livro na bolsa e, à distância, telegrafou um sorriso para Marcos, convidando-o a sentar.
_Achei que você não vinha.
_É... eu só achei sua carta a pouco tempo, quase agora.
Houve um silêncio.
_Surpreso?
_Sim... Mas alegre... Que coincidência, não é ?!? Você... e eu... sentirmos a mesma coisa.
_Você não está falando isso só para...
O sininho da porta tocou de novo. Isabel quase não se dava ao trabalho de olhar quem entrara. Mas quando olhou, viu que uma pessoa vinha em direção á sua mesa. Marcos só a percebeu quando ela estava diante deles.
_Nossa !!! Que bom! Encontrar meu melhor amigo e minha namorada aqui me esperando. Fiquei um pouco de tempo a mais no cursinho para acertar algumas coisas. Que bom que vocês me esperaram. Como sabiam?
Isabel reuniu forças para responder:
_Ah... Claro, Fernando! V...Você mesmo disse. Não lembra?!?
Marcos não conseguiu responder nada.

Um comentário:

de Dai para Isie disse...

Oi, Vail.

Parabéns pelo blog, ele está lindo! Eu já conhecia este conto, mas terei que lê-lo outra vez. Bom, vou tentar ler tudo o mais breve possível. Passei por agora mesmo só pra dar um alô.

Beijos!